Há dias, numa entrevista radiofónica , um inglês, casado com uma portuguesa e residente no nosso país, fazia notar que uma das diferenças em que mais tinha dificuldade em se adaptar, entre Portugal e a Inglaterra, um dos países com a taxa mais baixa de mortalidade nas estradas, seria o desleixo com que o condutor português conduz e estaciona.

Podíamos pensar nas motos de alta cilindrada, que passam a troar os ares, impunemente com velocidades (inimagináveis no resto da Europa do Euro) e agressividade sonora interditos aos veículos de 4 rodas, nos potenciais Kamikaze rodoviários das estradas com viaturas coladas a circular a 150 Km/h e mais, na economia paralela (fuga aos impostos e à segurança social, falsos recibos verdes, fuga de capitais), e na gestão, nem sempre muito rigorosa, de muitas autarquias.
Em Lamego existe um parque de estacionamento sui generis, brilhantemente improvisado pelos autarcas responsáveis, mas que não respeita muito o património urbano.
Todo um passeio de uma alameda arborizada, junto à Câmara está preenchido de viaturas estacionadas, que não ficam sujeitas a multa pois resolveram a questão colocando as placas, de forma completamente insuspeita, de estacionamento privado do Munícipio.
Entretanto muitas pessoas, desde crianças e mães a levar carrinhos de bebé, a velhinhos com bengala, insistem em usar aquele passeio tendo de se descolar, quase todo o percurso, a descer e a subir do rebordo para a sarjeta, e da sarjeta par o rebordo.
A Câmara Municipal devia nas extremidades do ex-passeio colocar setinhas a recomendar o uso só do passeio oposto. Ao fim e ao cabo, naquela alameda, deixaram de haver dois passeios visto um deles ser agora um parque de estacionamento.
Mas em Portugal ninguém leva a mal.
Contudo, esta aparente tolerância, esta cumplicidade transversal à nossa sociedade, acaba por encobrir o que no fundo significa, o que no fundo gera: uma falta de confiança generalizada nas instituições e no outro.
Isso foi bem evidente no referendo à regionalização.
O lógico era que as pessoas votassem sim para que as regiões pudessem ter mais autonomia na gestão das suas mais valias, e responder mais adequadamente às necessidades da população, por um melhor conhecimento, por uma convivência quotidiana e pessoal com essas necessidades.
Teoricamente a regionalização teria tudo a favor, por exemplo numa região como a do Douro, a região agrícola mais auto-suficiente do país e com um turismo que tem vindo a crescer exponencialmente.
Quem conhece melhor os problemas de uma região, quem os vive no terreno, no dia -a -dia, à partida é quem estaria mais apto a uma gestão eficaz dos recursos disponíveis (de origem fiscal, da União Europeia ou outros), mais do que aquele que tem a sua vida estabelecida em Lisboa e é sobretudo com a realidade e as solicitações da capital com quem tem de viver no seu quotidiano.
Mas, ao povo português quando lhe perguntaram se queria ser ele a assumir uma quota -parte maior nas responsabilidades do governo do país, votando sim à regionalização, de certa forma o povo viu-se ao espelho e disse não.
Em Lisboa bem podem dizer que para lá do Marão mandam não os que lá estão mas os que cá estão, na capital.

Todo o orgulho regional desaparece inesperadamente.
Que razões as câmaras municipais e juntas de freguesia no geral, tem dado para essa desconfiança a ponto de os portugueses terem rejeitado a descentralização, é um assunto que mereceria um grande estudo antes de novo referendo.
Das 2 maiores cidades o Porto, com bons exemplos paradigmáticos de afirmação regional, foi uma das excepções e votou sim à regionalização, Lisboa apesar de ser na altura maioritariamente de esquerda (que defendia a regionalização) votou naturalmente não, pois quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não tem arte.
Houve na capital nortenha vozes importantes da sociedade dita civil em defesa da regionalização.
Mas o resto do país tirando, salvo erro, Évora e outra cidade provavelmente insular, não as acompanharam neste empenho, nesta paixão regional.
Em Portugal somos socialmente tolerantes, cúmplices e complacentes, com fugas aos impostos, desvarios rodoviários, comportamentos de má cidadania, pecadilhos institucionais mas que nos deixa, como povo, e no que é transversal a toda a sociedade portuguesa, seguramente com algum desconforto ligeiro e uma leve suspeita de com outra cultura social mais impregnada de responsabilidade cívica o País estaria agora bem mais tranquilo e confortável.
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