sábado, 11 de agosto de 2012

Fotografar um monte de terra.


Lamego, um apontamento de 2009, mas que aborda um problema que se manterá sempre actual, como se verificou recentemente, com o derrube selvagem, em termos de paisagem e de usufruto das populações, de grandes árvores frondosas e de outras mais pequenas, mas que davam sombra, na Figueira, junto ao rio Balsemão, aparentemente à revelia da Junta de Freguesia.




Quem passa na estrada nacional, pela velha ponte de Reconcos depara-se, a enquadrar o rio Balsemão, com um cenário desolado de terra cinzenta, revolvida, tubagens e uma cerca de cimento e arame. 

Até há poucos anos havia um declive suave, de acesso fácil ao rio, no que era um local, comparativamente ao restante da vizinhança, bucólico e aprazível.

Era frequente ver, na época estival, crianças a chapinhar na água, ou a vogar em barquinhos de borracha, rumo a um pequeno rochedo, no meio do riacho que, na sua imaginação, o olhavam como se fora uma ilhota, sob o olhar deleitado e atento dos pais.
Até os adultos se divertiam a molhar os pés.

  Embora com a presença vizinha de um pequeno armazém, em cimento à vista, sempre vazio, sem porta, e abstraindo-nos dele e da sua fealdade, era um recantozinho, de acesso fácil, para se parar o carro, estender a toalha da merenda, e ter as crianças entretidas, a brincar no riacho. 



Não abundam tantos espaços quanto isso, na região.

  E assim foi, durante décadas (ou mais), sendo, este local, carinhosamente conhecido como a praia de Reconcos. 

De repente começaram as mudanças, alguém que aparece a colocar um aviso de propriedade privada, um letreiro a pô-la à venda com o dito armazém, e que a seguir isola o local com uma cerca de arame, a impedir o acesso, e finalmente, a visão de amontoados de terra, a condicionar um declive íngreme até à água.

 Onde havia descidas suaves e com vegetação, para pessoas e também para o gado à procura de água, há agora uma muralha implantada, de terra cinzenta e árida, como num mini cenário de guerra. 

Onde havia um pequeno aterro para deixar o carro, a terra está revolta, inacessível, mesmo para um Defender.

Um ambiente árido, com amontoados de terra, sem vegetação, a impossibilitarem o usufruto pelos ocasionais veraneantes, que não têm agora muitas outras alternativas, por perto.

Como se fosse esse o objectivo em que os responsáveis se empenhassem de forma tenaz. Pelo menos é o que aparenta.

Mas certamente a causar desconforto e decepção nos turistas, que por aqui se aventuram e, no geral, a quem por aqui passa, à espera de se encantar com uma natureza mais respeitada e conservada, à procura dos recantos de um Portugal mais idílico e convidativo. 

Sendo este local contíguo a duas estradas, sendo uma das estradas nacional e turística, penso que esta intervenção implacável  poderia ficar abrangida numa qualquer legislação sobre a protecção do ambiente, sobre a preservação da paisagem (que tem levado à remoção das sucatas, por exemplo) ou outra(s) que salvaguardem o interesse público e do turismo e lazer.

E como diria um arquitecto célebre, uma casa não é só de quem a tem é também de quem a vê. Podia-se aplicar este pensamento ao meio ambiente natural, mesmo em regiões de evocação menos sonante. Pois, ao fim e ao cabo, a imagem do país, é a soma das partes.

Há também a ter em conta a utilidade para o gado da região, que lá ia saciar a sede, por certo desde há séculos, e que agora tem estes caminhos cortados.

Grosso modo, ou os responsáveis autárquicos estão distraídos, ou há perspectivas diferentes, mediante os interesses e interessados em causa, ou simplesmente até pode ser tudo absurdamente muito legal.

De qualquer forma, independentemente das razões possíveis, foi sacrificado o interesse público em termos de ambiente natural, de pastorícia e de lazer. 

Mesmo pelas melhores razões, pelos mais fortes motivos, deveriam encontrar maneiras de salvaguardar o usufruto visual e lúdico, daquele espaço ou de atenuar tal impacto.

Uma das últimas imagens que eu conservo, é a de dois ciclistas jovens, com os seus sacos de viagem, pateticamente a procurar, com as suas máquinas fotográficas, algum resquício de paisagem, que tenha escapado ao vandalismo. Mais vale passear nos centros comerciais.